quarta-feira, 13 de outubro de 2010

“O mendigo e o milionário” (ou “Em quem votarei nestas eleições”)

O mendigo e o milionário encontram-se no sinal. É o dia do aniversário de ambos. Quarenta anos, pode ser? (Podem mudar a idade, se quiserem; não importa...)
Digamos que nasceram exatamente no mesmo dia do mesmo mês do mesmo ano, e estamos conversados. Se você acreditar em papai noel, duendes ou signos, afirmo que os dois, mendigo e milionário, são de escorpião rosa-choque com ascendente em pônei manco africano.

Posto o quadro, faço a pergunta: quem tem mais mérito por estar vivo? Um, por ostentar três pontes de safena (resultado praticamente inevitável de mais de vinte anos de estudo – árduo e sério – e de uma rotina de trabalho escravo-contemporânea)? Ou o outro, por sobreviver tanto tempo com um suprimento inacreditavalmente baixo de tudo quanto é necessário para manter a vida até de um recém-nascido?

Sinceramente, não sei.

Se a pergunta fosse colocada de outra forma, no tempo exato de segundos que dura a cor vermelha do sinal, não teria dúvidas em responder: “ora, mais do que ter as oportunidades na vida, é preciso aproveitá-las”.

Mas aí penso: será que sou imparcial o suficiente? Ou eu estou simplesmente encarnando a problemática, pra afirmar que tive, sim, as chances – é inegável – mas não tirem meus méritos por tê-las aproveitado?

Neste sentido, sinto-me muito mais próximo do primeiro (exceto na parte do milhão, vejam bem).

Só que não me permito mais essa mentalidade liberal que iguala milionários e mendigos.

Mendigo e milionário no Brasil são, desde o berço (aos felizardos que o têm), seres tão diferentes que quase se pode dizer que não são da mesma espécie: há, perdoem o mau latim, o homo brasileirus pobris e o homo brasileirus ricus.
Às duas se dá o direito de sonhar, só a uma o de realizar.
Só uma delas – adivinhem qual! – ganha por herança terras, boa educação, saúde, cultura, posição social

Sei que, neste momento, vocês estão se perguntando: aonde isto aqui vai chegar?
E a partir de agora tento esclarecer.

Demorei tempo demais pra me convencer da justiça e efetividade de algumas políticas, dentre elas a cota nas universidades e os programas assistencialistas (sim, falo mesmo do Bolsa Família).

Jurei que, nestas eleições, não tomaria partido (com “pê” minúsculo, mesmo, porque nos “pês” maiúsculos já não tenho mais qualquer confiança nem esperança daquelas infanto-estudantis).

De comum nesses dois parágrafos aí de cima, a inércia. E, cá entre nós, no fim das contas não sair de cima do muro já é uma escolha, ainda que a mais hipócrita e vergonhosa delas.

Ora, antes que se discuta qualquer projeto sério de país (ou de qualquer outro ambiente social, micro ou macro) é necessário antes de tudo que sejam todos minimamente educados, que tenham uma condição digna de saúde, e, o mais importante: que estejam de barriga cheia.
Devem receber ajuda em troca do quê!? De nada. Tudo pela simples condição de serem humanos.

E aqui ligo todas as pontas deste texto esquizofrênico: simplesmente não pode haver a opção de não salvar os miseráveis.
Duzentos reais pra encher o próprio bucho e o da família. É pouco? Muito? Distribuído de forma errada? Tem fraude? Tudo deve ser revisto, mas não dá pra negar que o assistencialismo é ainda necessário no Brasil. E será por muito tempo.

Detesto o PT tanto quanto detesto o PSDB. Como diria Aldir, não teriam meu voto nem para síndico do prédio (e me refiro a praticamente todos os “pês”, todos eles iguais, os que não são piores), mas tenho a certeza de que “nunca na história deste país” a questão da desigualdade foi discutida tão amplamente pela sociedade. E já é um projeto vencedor, tanto que nem sequer a direita – se é que já não viraram todos ambidestros – ousa propor uma mudança radical.

Nem Dilma nem Serra estão à altura de dirigir o Brasil da maneira como ele precisa. Juro que levo um susto toda vez que, distraído, olho pra um dos dois sorrisos (e espero que todos entendam que digo isso por metonímia). Ambos são, na minha opinião, ruins. Muito ruins!
(Para não deixar dúvida: o Lula também está nesse mesmo grupo.)

Mas, na falta de terceira opção, votarei pela continuidade de um projeto que, se não mudou o país, ao menos colocou o primeiro tijolo.
O caminho está errado? Talvez. Só que ao menos já estamos olhando para o lado certo. “Pela primeira vez”, se conheço bem esta Pindorama.

De todo modo, torcerei (e muito) para que a sociedade já tenha adquirido maturidade suficiente para que, caso no final vencida a situação, possa freiar a reentrega do poder absoluto aos homo ricus, ao milionário.

Pronto. Para o bem ou para o mal, não me permitirei calar. É este o meu voto: Dilma.
E com isso não pretendo afirmar que outro voto, talvez o seu, esteja errado.
Já ficarei feliz se todo mundo se propuser a, no mínimo, pensar melhor sobre o assunto.

Ah! O sinal já abriu faz tempo, mas continuo envergonhado (de mim) por saber que vivo num mundo onde ainda existe a fome. E que ainda há gente que não põe o problema como absoluta prioridade.

3 comentários:

  1. Incrível! Concordo com você em absolutamente tudo, só não saberia expor tão bem o meu pensamento e posicionamento.

    O que falta é oportunidade! Que diabos de justiça é essa que nega o direito a alguém, quem quer que seja, de sonhar? É triste quando ouvimos uma criança miserável dizer que sonha em ser médica e, lá no fundo, sentirmos "pena" por saber que ela nunca chegará a ser (quem é digno de "pena" somos nós que achamos que essa nossa compaixão já é o suficiente). Ou olhar pra dentro de uma universidade - inclusive pública - e vermos, claramente, a separação entre os mais e menos afortunados. Direito, medicina, odontologia, ah, isso não é pra todos. Os mais pobres tem que se contentar com arquivologia, biblioteconomia e letras. (Sem desmerecer, DE MANEIRA ALGUMA, essas faculdades!!!).

    Ou seja, se dentro das próprias universidades já há segregação, que dirá sem cotas. Quer dizer, com cotas há o preconceito, mas dá ao menos uma paridade de armas entre os envolvidos.

    É óbvio que a mudança tem que vir da base e blá blá blá. Esse discurso todo mundo já sabe e tem na ponta da língua. Mas isso é a longo prazo. E os pobres e negros (sim, eu os incluo nessa lista) de HOJE? O que lhes resta? Um pedido de desculpas e uma promessa de que a longo prazo seus filhos, quer dizer, seus netos, talvez, terão igualdade de oportunidades. Melhor pagar essa dívida histórica que temos com eles agora. Que seja com assistencialismo, mas é melhor do que se acomodar e sempre jogar prum futuro (beeeem longe) a solução, talvez, desses problemas.

    Eu acredito em políticos tanto quanto em papai noel. Mas acredito em política. E é por isso que eu decido me posicionar. Talvez fria pra uns, quente pra outros. Mas nunca morna, nunca em cima do muro.

    Meu voto também é da Dilma.

    P.S.1: Desculpe pelo comentário imenso.
    P.S.2: Jura que você não acha o sorriso do Lula, com aquelas covinhas, bonitinho? rs
    P.S.3: Quase parafraseando o Lula, "nunca na história desse blog" eu gostei tanto de um post seu.
    P.S.4: Virei sua fã. Pronto!

    ResponderExcluir
  2. olá,
    adorei o que você escreveu, não só porque compartilho com seu pensamento, mas principalmente pela forma como você expôs:de uma sensibilidade incrível!
    aliás, já li outros textos seus aqui e percebi que você escreve muuito bem!parabéns!

    ResponderExcluir
  3. Acho que vc jogou a moeda pra cima..rss
    Concordo em termos. Afinal, é complicando não se render aos seus encantos...pelo menos é o que sinto quando venho aqui. Odeio o PT com todas as minhas forças e acho que isso não muda tão cedo. beijo moço

    ResponderExcluir