terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

Soy loco por ti, América - Parte VII - Um cantinho, um violão

Estava mais para uma casa abandonada do que para um albergue (tive que me controlar pra não dizer “um lugar habitável”).

Um portão enferrujado, um pátio vazio, lá ao fundo uma construção.
Na parede, ao lado da entrada, um aviso pintado no muro: “Hotel”.
Um toque meio desacreditado na campainha, enquanto a cabeça já voava pensando em planos Bs, Cs, Ds, Zs. Um banho e um lugar pra dormir, era só do que eu precisava.

Até que uma senhora simpática acabou com tantos "uns" perguntando, antes de abrir a porta com ruído de dobradiça que nunca viu óleo: “Melendez?”

"Soy yo!"
(Não que a resposta, aliás, fizesse diferença. Já pensaram? “Olha, senhora, não sou eu não... Eu vim, na verdade, assaltar a casa. Mas se a senhora abrir a porta eu explico direitinho...”)

Fato é que era mesmo ele, Hector Melendez, em osso, músculo e simpatia.
Pra falar a verdade, eram ele e Senquévis, o polaco metido a ornitólogo, que não cabia em si de felicidade com o saudável diálogo que mantinha com o papagaio morador da casa:
- Loro!
- Loro.
- Looooooro!
- (bocejos do papagaio) Loro.
- Sabia que é a primeira vez que eu falo espanhol com um pássaro?

Meia hora tiveram que esperar até o quarto estar “pronto”. E com certeza teria demorado muito mais se Hector não tivesse tirado um sonzinho bossa nova do violão com quatro cordas desafinadas que encontrou largado por lá.

Num instante, encontraram um cantinho pro sagrado descanso dos viajantes.

Soy loco por ti, América - Parte VI - “Señores pasajeros, bienvenidos a la Ciudad de Guatemala...”

Pronto. Depois de dezessete horas, eu estava lá. E agora? O que me esperava? O que esperar?

Tentando me despir de preconceitos (se bem que não ter preconceito já é uma espécie de preconceito... ou estou muito filosófico?), estava pronto pra encarar qualquer coisa.

Quase qualquer coisa.
Porque a gente passa a vida inteira achando que nunca vai encontrar um endereço mais complicado que os de Brasília. E aí se depara com um troço que faz pensar que a pessoa, na hora de digitar, acabou sentando sem querer em cima do teclado: “8 Calle 7-29 Zona 9, #65”.

Pedi penico e dei uma de gringo: mostrei o papel pro taxista e perguntei:
– Cuanto cuesta?
– Cincuenta quetzales.

Eu acabava de aprender que o Quetzal é a moeda local. A segunda lição era que a moeda local não vale um tostão furado.
Não que fosse preciso pensar nisso na hora... A confusão na porta do aeroporto, as nossas mochilas, o receio de um lugar desconhecido, e – principalmente – a cara de gringo-em-férias-tropicais do Senquévis não nos deixavam margem para negociar. Muito menos para ficar zanzando por aí.

E, se é para o fim nobre de satisfazer vossa curiosidade, não tenho problemas em dizer que os dez reais da corrida foram bem pagos (mas, da próxima vez, juro que pechincho, só pra não perder a prática).

Soy loco por ti, América - Parte V - Ejecutiva? Yó?

Depois de ter voado oito horas com um mísero sanduichinho de milho, quem é que se arriscaria a não fazer um baita lanche na hora da conexão?
Certamente, não eu, viajante vacinado nos serviços de bordo.

Fiz então meu último lanche da era a.Q. (um dia, vocês entenderão o que significa).

O único problema foi que eu ainda não tinha nem começado a digestão quando descobri que, pela primeira vez na vida, iria viajar na classe executiva.
Não me perguntem o motivo, porque até hoje não descobri. Talvez tenham me confundido com algum sex symbol local (ou só se confundiram, mesmo, o que não é de surpreender).

Aliás, não sei se foi por causa da minha roupa ou da minha cara de espanto, mas meus vizinhos executivos estranharam a situação mais do que eu.
E certamente a voracidade com que devorei o farto jantar não contribuiu positivamente para minha imagem.

Querem saber? No fim das contas, é como dizem os centro-americanos: “no soy de acá, no vine para quedarme”.
Lambi os dedos.

Soy loco por ti, América - Parte IV - Mei dim Brazil

É mais ou menos assim: você desce do avião, e encontra várias hordas de brasileiros andando nos mais variados sentidos: crianças com orelhinhas do Miquei e brinquedinhos eletrônicos, mulheres com botas de couro e casacos felpudos (mesmo num calor equatorial), e homens com camisas Tomi cheias de bandeiras do Zeú.

Não tem jeito: todos os voos da Copa que vão para Miami fazem escala na Cidade do Panamá, e eu, que não tenho nada a ver com a peregrinação à Meca do consumismo, acabo tendo que dividir o espaço com eles (não deixem de notar o tom do “eles”, fazendo o favor).

Que bela maneira de começar uma viagem que tinha como um dos propósitos principais não encontrar brasileiros...

Mas deixe estar: postos os pés no avião pra Guatemala, duvido que eu os encontre. Afinal, não é chique contar pros vizinhos que já foi à América Central, né?