quinta-feira, 25 de março de 2010

Carnaval em Salvador - A Saga - Parte XIII - Réquiem de um Carnaval

O último dia.
Aquele gostinho de “já acabou” mesclava-se com o de “quero mais”.
E a mistura tinha um sabor amargo.

Histórias...
Risos, lágrimas, chegadas, partidas, desencontros, encontros, amizades, amores.

O acordar na terça-feira trouxe muitas lembranças.
Só de pensar que, há seis dias, aquele Carnaval se apresentava como quase eterno...

Mas cada dia foi um dia a menos.
E naquela manhã, naquela terça, era só um dia que sobrava.

Levantaram-se perguntando “por quê?”.
Se a vida pode ser tão boa, por que tanta preocupação, tanto compromisso, tanta responsabilidade?

É nessas horas que se entende o motivo de tanta gente largar tudo que faz, e ir vender bijuteria numa praia paradisíaca ou abrir uma pousada num recanto pacato da serra.

Pois foi nesse clima, quase que se sentindo obrigados a aproveitar cada segundo que lhes restava, que eles partiram para aqueles últimos 4 km.

Então, como de costume, colheram as bênçãos no Farol.
Como de costume, sentiram o êxtase com a multidão desordenada de cores na Barra.
Como de costume, sentiram o corpo tremer com os primeiros acordes de um trio que passava por ali.
Como de costume, abraçaram-se quando aquele caminhão que iam seguir começou a se mover.
Como de costume, cantaram, curtiram, aproveitaram esse – delicioso e curto – espaço de tempo em que a carne ainda não é algo mortal.
Como de costume, foram protagonistas de histórias impublicáveis até pelo mais impublicável dos autores.

Mas, naquela reta final, lhes faltou coragem.
Olhando para o fim, recusaram-se a acreditar.
Doeu pensar que teria que haver uma última música...

Um calafrio percorreu cada um daqueles três corpos, ainda exaustos de tanta folia.
Será que, depois de tudo aquilo que viveram, restaria só o silêncio?

Não puderam – nem quiseram – descobrir.
Fugiram.

Trôpegos, correram.
Enquanto se afastavam, ouviam a música diminuir aos poucos.

E ela diminuiu, diminuiu, diminuiu...
Mas não parou.

Até hoje, quando eles, em qualquer lugar, prestam um pouquinho de atenção, ainda escutam, bem baixinho, um “Aaaaaaaaaaah! Imagina só... Que loucura essa mistura... Alegria, alegria é o estado que chamamos Bahia”...

Aí, lembram que passaram, juntos, aqueles momentos de que irão se lembrar para sempre.

E, como que para agradecer por tudo, sorriem.

terça-feira, 23 de março de 2010

Carnaval em Salvador - A Saga - Parte XII - Besouro não sabe escolher

"Pizza é feito sexo. Até quando é ruim, é bom."
Você certamente já ouviu esse ditado mentiroso...

Mentiroso pela pizza - é claro -, não pelo sexo.

Aliás, acho uma grande sacanagem (literalmente) comparar coisas tão diferentes.
Deixa pra lá... Tem gosto pra tudo, né?

Mas divago.

Voltando ao assunto...
Saindo da farra, e loucos por uma comida com alto teor de gordura, Hector, Lete e Besouro foram direto procurar uma pizzaria.

Depois de enfrentarem alguns pares de olhares desconfiados, e de receberem algumas respostas suspeitas (“Como assim está lotado? Eu estou vendo dez mesas vazias ali...”), nossos heróis finalmente conseguiram se sentar.

Cardápios em punho, começaram as gentilezas:
- Ah!, gente... Tirando abobrinha, eu como de tudo...
- Galera, por mim, tanto faz. Só não gosto dessa de jiló com endívias.
- A minha preferida é de calabresa, ovo e catupiry, mas pode pedir essa de rúcula com espinafre...

Trocando em miúdos, tudo na mais perfeita normalidade; situação normal de jogo...

Só que havia um porém.
Ninguém contava que Besouro, num arroubo de liderança, resolveria encerrar as conversas.

Antes que os outros se dessem conta, chamou o garçom e proferiu a senteça:
- A gente vai querer aquela ali, ó! Tamanho extragrande dinossauro... – disse, enquanto apontava, de forma nada discreta, para a mesa ao lado.

- Alguém se incomoda? – completou.

Na hora, ninguém teve coragem de contestar.
Depois, resolveram pelo menos perguntar.

Mas Besouro não fazia nem ideia do que tinha pedido.
Confessou, em meio a risinhos, que tinha achado “bonitinha” a comida dos vizinhos...
“E, afinal de contas, todo mundo disse que não se incomodaria, não é?”

Pois bem. A partir daí, a expectativa foi grande.
Nervos à flor da pele.

Lete chegou a discutir com um perplexo garçom, jurando que tinha pedido um suco de latinha, não de garrafinha.
Hector lambia o garfo mal lavado, tentando encontrar algum sabor perdido da última pizza que havia passado por ali.

Pobres coitados...

O garçom acabou com todas as suas ilusões:
- Pizza extragrande dinossauro, sabor pimentão amarelo africano com alcachofra.

Bom, cada um foi obrigado a comer a seu modo.
Enquanto Hector raspava a cobertura, e comia só a massa com catchup, Lete cobria a pizza com uma massaroca de queijo com pimenta.
Só Besouro parecia aprovar a escolha: “Galera, está iraaaaaaaaaaaada!”.

Sob olhares indignados, e com pedaços de pimentão no canto da boca, ainda teve a audácia de sugerir: “Vamos pedir outra igual?”.

Não preciso nem dizer que, dessa vez, ninguém foi gentil...

terça-feira, 16 de março de 2010

Carnaval em Salvador - A Saga - Parte XI - Não quero ver pipoca pular...

Lembra daquela musiquinha? “Pipoca na panela, tcha-rãnanananã, tchananananã, tchananãnananãuuuuuuuuu! Pipoca e guaraná, um programa legal... Só eu e você, que sede que dáuuuuuuuuuuuuuu”.

Pois tenha cuidado!
Porque o jingle não alerta para o perigo que pode ser deparar-se com o mais temido de todos os cereais: a sagaz, temida, sorrateira... Pipoca de Salvador!

Ao contrário de suas congêneres, ela não tem aquele quê de festa-infantil-com-música-da-Xuxa-e-adultos-bêbados-dançando-macarena.
Muito pelo contrário!

Desde que puseram os pés na cidade, nossos amiguinhos foram alertados sobre a tal carnavales salvadoria pipocum: “Meu rei [voz arrastada], se eu fosse você, não sairia da corda sem o apoio do BOPE... Porque a pipoca pode acabar te engolindo”.

Bom... Mas vocês conhecem a Lete, né?
É óbvio que ela, com toda a sua insistência irritan..., digo, seu ímpeto aguerrido, decidiu que tinha que ir para o camarote.“Se ninguém me levar, eu vou sozinha”.
E, ignorando todos os avisos, perigosamente aproximava-se da misteriosa entidade.

Sobrou – claro! – para Hector, que com seu desprendimento e elevado espírito de heroismo, foi obriga..., digo, voluntariamente decidiu acompanhá-la.

E seria demais pedir que o fizesse sorrindo, né?

Mas não é que Lete resolveu reclamar das reclamações de Hector?

Juro púrpadimpádiciço que as palavras dela foram as seguintes: "Se for pra ficar com essa [piiiiiiiiii] de mau humor pra me levar, é melhor [piiiiiiiiii]... Que [piiiiiiiiii]!".

E saiu desaparecendo feito manteiga no meio de toda aquela pipoca, enquanto Hector, desesperado, tentava agarrar-se a um fiapo do abadá da perturb... digo, querida amiga.

Foi só em seu sprint final, depois de derrubar duas velhinhas e tomar mais de uma dúzia de cotoveladas, que Hector finalmente conseguiu agarrar-se à Lete, que, com cara de perdida e assustada, fingia ainda estar zangada:
- Olha, só vou deixar você me levar até lá porque não quero que você fique com peso na consciência, tá? Porque eu poderia [snif] muito bem [snif] ir sozinha!
- Mas Letezinha do meu coração, você estava indo para o lado errado... – dizia carinhosamente Hector.
O que, obviamente, não era suficiente para amolecer aquele coraçãozinho magoado:
- Tá vendo?! Seu grosso [snif]! Se era pra reclamar de mim, era melhor não ter vindo... - berrava ela para um perplexo Hector, enquanto fingia tentar esquivar-se dele, que a mantinha sob controle com a “invencível” força de seu dedo mindinho.

E foi assim, nesse árduo conflito, que Lete chegou, sã e salva, ao desejado camarote.

No dia seguinte, pulando sobre Hector com sua máquina fotográfica, exibia com orgulho as fotos da festa...
A primeira vinha acompanhada de um "Tá vendo meu nariz vermelho nessa aqui, ó? Eu chorei de verdade, viu?". A segunda era embalada a um "Olha só todo mundo me consolando... Dá até pra ver meu biquinho aqui... Viu? Viu?". E todas as outras vinham (aliás, até hoje vem) com o bordão "Foi tudo culpa sua!".

Mas pode brigar, Lete...
Pode brigar, porque o Hector não se importa.
Pra ele, você pode tudo!
Afinal, é pra isso que servem os amigos.

Pra isso e pra se meter na pipoca, é lógico!


(Escrito sob a supervis... digo, com a colaboração de Lete. Especialmente no final.)

segunda-feira, 15 de março de 2010

Carnaval em Salvador - A Saga - Parte X - A pata do camaleão

Algo perturbava Hector.
Veio assim, de mansinho, e logo, logo, ele não conseguia pensar em mais nada.
Era como se a sua bexiga, de uma hora pra outra, tivesse tomado a decisão: "hoje é o meu dia; hoje não tem Carnaval pra você".

Olhando para o lado, só o que se via era uma multidão que, insensível à luta interna travada por nosso galã, erguia as suas grandes patas alegóricas de camaleão.

Bem, fosse um desenho animado, teria, nessa hora, brilhado uma lâmpada ao lado da cabeça de Hector: sua salvação estava ali, ao seu lado, o tempo todo.
Como que por iluminação, viu que, pra resolver o seu problema, bastava colocar a mão na massa... digo, na pata!

O plano, simples, logo começou a ser executado.

Com toda a discrição que o seu abadá permitia, e um singelo assobio para demonstrar que não fazia nada a que não estivesse acostumado, sentou-se ao asfalto em ebulição.
A pata do camaleão posicionou-se em seu lugar, a proteger a casta intimidade de Hector.
Estava tudo pronto...

E teria corrido bem se Lete - ela, sempre ela - não tivesse soltado o berro:
- Ai! Que nojo!

Aí, meu amigo, babou.
Em uma fração de segundo, abriu-se um clarão tão grande em volta de nosso herói que, dizem as más línguas, fez com que aquela patinha pudesse ser vista até do espaço.

Besouro bem que tentou ajudar.
Despejou uma latinha inteira ao lado do ouvido de Hector, fez barulhinho de chuva e até cantou a musiquinha do xixi.
Mas não teve jeito. Veio a confissão: "travei"!

Ainda meio envergonhado, Hector levantou-se do chão, deu umas sacudidelas na bermuda empoeirada e, tentando misturar-se aos outros foliões, acenou com a patinha que, momentos antes, poderia tê-lo salvado.

O dia era mesmo da bexiga...

terça-feira, 9 de março de 2010

Quem foi o retardado...

...que colocou um GORDO pra fazer propaganda de um refrigerante ZERO?

É mais ou menos como botar um careca pra fazer comercial de xampu.

Eu já parei de beber...
Guaraná! Que fique claro.

segunda-feira, 8 de março de 2010

Carnaval em Salvador - A Saga - Parte IX - Baianidade Nagô

Rudrigo Nagô é um baiano tão baiano que, perto dele, Caymmi ficaria parecendo um sueco.

E foi ele - Nagô, não Caymmi - quem apresentou aos nossos amiguinhos a “caça aos cordões” (atividade que, em número de praticantes, só perde para a mui extenuante “caça ao garçom baiano”*).

Testemunhas dizem ter ouvido Lete reclamar – “sem segundas intenções”, jura ela, de pés juntos – que, depois do quarto dia de Carnaval, não havido conseguido sequer um cordãozinho de um Filho de Gandhy.
De pronto, foi rejeitada e seguida de severa reprimenda a sugestão de Hector: a de que Lete comprasse o tal adereço por mísero R$ 1.
Bom de coração que é, ainda lhe ofereceu, gentilmente, um dos seus, beata atitude punida com uma bofetada.

Nagô, que do seu canto observava tudo com um risinho de deboche, logo encontrou a solução.
Lançando-se feito um bólido no meio da multidão, sempre com o dedo em riste apontando para Lete, passou a interpelar qualquer Gandhy que passasse pela frente. E olha que não só os Filhos. Netos, tios, primos de quarto grau; ninguém escapou.
Há rumores, inclusive, de que Nagô tentou conseguir um colar até com o Tio-Avô de Gandhy, aquele que sempre faz piadas depois de flatular à mesa.

E todo esse esforço – pasmem! –, por alguma razão totalmente desconhecida, foi incompreendido por Lete, que, numa perseguição digna de filme hollywoodiano, passou a tentar agarrar-se ao pescoço de Nagô.
A sorte dele foi a de, no calor do momento, lembrar que Lete é incapaz de saltar de uma altura maior que 15 cm.
Aí, foi só atrai-la para o posto de observação policial (de onde Hector teve que tirá-la, muito tempo depois, afogada em lágrimas, antes que o pior acontecesse).

Resultado: Lete chegou em casa sem nenhum cordãozinho. E toda suada.

Não sei se é verdade, mas ouvi dizer que, agora, Nagô passa duas voltas no cadeado antes de dormir.
Tudo porque uma vidente leu nas cartas que alguma doida ia tentar enforcá-lo com um cordão azul-e-branco. Ou algo do tipo, não lembro direito...

* A última vez que a espécie, dotada de apuradas técnicas de mimetismo e camuflagem, foi vista atendendo ao chamado de uma mesa foi no Carnaval de 1997.

domingo, 7 de março de 2010

Domingos

Ah! Nada como passar a tarde de domingo lendo um bom livro, comendo uma boa comida congelada, e vendo uma boa comédia româ... digo, um bom filme do Chuck Norris.

Foi sem querer querendo...

Eu sei que é difícil de acreditar, mas eu (ainda) tenho uma vida social.
Não chego a viver como um ex-BBB, mas tenho lá minha programaçao de fins de semana.

E foi na última dessas incursões ao mundo real que eu ouvi a pérola.
Poderia até ter passado despercebida, mas não passou: “Foi sem querer que eu beijei a sua boca, menina tão louca, eu quero te beijar”.

Silepses afora, me explica esse negócio. Como é que funciona?

O cara está lá andando na rua, desatento, pensando no presente de aniversário que vai dar pra vovó. De repente, pá! Percebe que, ao invés de uma, tem duas línguas na boca.

Dá até pra reparar que a música tenta explicar: “menina tão louca”.
É! Só pode ser doida mesmo...

Agora, pensando bem, essa estória pode ser até perigosa.
Porque você, prestando atenção, já não beija boa coisa.
Se começar a sair por aí dando beijo sem querer, corre o risco, no meio do caminho pra padaria, acabar agarrado com uma mulher de barba e pomo-de-adão.

E aí, meu amigo, é tarde demais!

Cuidado, viu?

sexta-feira, 5 de março de 2010

Promoção Viaje com Hector

[Tela escura. Letras brancas subindo “a la” Guerra nas Estrelas. Locutor com voz grave.]
Você é mulher entre 18 e 65 anos?
Gosta de relatos de viagem?
Quer um só seu?
Então, é só participar da promoção...

[Fade in: foto de Hector de sunguinha branca. Mulheres em coro, histéricas.]
VIAJE COM HECTOR!

[Novamente o locutor. Tom animado.]
É muito fácil: basta comprar uma passagem para qualquer lugar do mundo em nome de Hector, H-E-C-T-O-R, Melendez, M-E-L-E-N-D-E-Z, o Z assim mesmo, com a língua entre os dentes.
Depois, é só enviar para a Caixa Postal 1505, com foto de corpo inteiro, frente e verso, e uma frase explicando por que você merece ser a Miss Melendez.

As melhores fotos ganham um fim de semana de companhia do galã dos galãs, com direito a uma apresentação íntima de funk latino.

Vai perder esta oportunidade?

[Mulheres correndo. Tumulto. Gritaria. Hector na tela.]
- Eu não perderia...

[Piscadela marota. Fade out.]

quinta-feira, 4 de março de 2010

Carnaval em Salvador - A Saga - Parte VIII - Strawberry Fields Forever

Quanto tempo você demora no banho?
Cinco minutos? Dez? Quinze?

Pois eu conheço alguém capaz de bater todo e qualquer recorde neste quesito.
Uma pessoa que mede seu tempo de toilette em horas, não em minutos.

Senhoras e senhores, com vocês, agora desfilando neste blog... [rufar de tambores] Moranguinho!

Gostaram desse jeito de menina moça, e desses gestos delicados?

Cuidado; não se enganem!
Porque, à tíbia luz da lua cheia, esse Moranguinho pode, a qualquer momento, transformar-se noooooooooooou... Psychohardcrazytrance Morango!

Você olha o rosto avermelhado, e percebe que tem alguma coisa errada.
Os cabelos ganham vida própria, e insistem em sair da sua posição...
O sorriso agora vai de orelha a orelha.

De uma hora para outra, ela começa a falar em um dialeto desconhecido: “Prvocê tchsabe chque eul khsgosto thmuito de focê, né?”

Logo, logo, vêm as outras frases (tão embaralhadas quanto, mas já traduzidas), não necessariamente nesta ordem: “Penteia o meu cabelo”, “Como é o nome dele?”, “Quero mais uma ice”, “Me dá um gole da cerveja”, “Como é mesmo o nome dele?”, “Geeeeente, muito legal estar com vocês”, “Êêêêêêêêêêê”, “Eba! Vamos pro Fortal”, “Tenho que fazer xixi”, “Caramba! Já esqueci o nome dele” e “Vou tomar outra ice”.

Sempre, é claro, acompanhadas de abraços e mais abraços nos amigos.

E quer saber de uma coisa? Na hora que isso acontecer, corra pra lá...
Porque duvido que você consiga se divertir tanto em qualquer outro lugar do mundo.

Volta, Aldir!

Qualquer escritor mequetrefe sonha em, um dia, escrever como seu grande ídolo.
Com Hector não é diferente...

Aldir Piscina. Já ouviram falar dele?

Tudo - absolutamente tudo - que se escreve aqui é uma imitação barata do estilo desse gênio da literatura jovem.

Duvida? Então, dê uma olhada:


"Profusão de Malas

Primeiro chegou o Bagunça, que surgiu primeiro como só uma cabecinha olhando para dentro da arquibancada, procurando por conhecidos, depois se animou e entrou saltitando como uma gazela com frio e praticando todos aqueles atos que tanto cobrem de vergonha a sua pessoa e embaraçam os seus amigos e conhecidos, como cheirar os cabelos das mulheres, comentar efeminadamente peças de roupas dos colegas machos ('aí, esse tom de púrpura com fúcsia não caiu bem em você!'), encostar-se a outros machos com abraços e afagos ao puxar papo e, hors-concours, arrozar a mulherada. Atrás chegou o Felipinho, que foi cumprimentar a sua fiel, Ju Pina. O pessoal ficou meio apreensivo, porque Ju tinha dito que seu outro namorado, um tal Moreno Alto, Forte e Sensual, estaria também nos Jogos – inclusive lhe mandara vários scraps no Orkut avisando – e o encontro de Felipinho e o tal Moreno Alto, Forte e Sensual, que já vinha se anunciando desde há muito, poderia acabar em pancadaria, com óbvias desvantagens para Felipinho. Depois chegou Paulinha Alexim, carregando vinte quilos de mala em cada mão e desviando bravamente de várias sovacadas dos torcedores que pulavam com os braços para o alto comemorando mais um gol. A tudo isso Aldir assistiu impassível. Mas não era tudo. De repente – não mais do que de repente – o olhar de Aldir é atraído para a entrada da arquibancada por um detalhe qualquer. No mesmíssimo instante, cruza o pórtico ele, que viria a ser a personalidade dos I Jogos Jurídicos do Sudeste; ele, que tanta diversão traria à galera; ele, que viera do Rio coladinho à traseira de Felipinho e Bagunça, os seguindo em seu carro com apenas um colchão na mala, poucas cuecas, uma enorme vontade de curtir a vida adoidado e absolutamente nenhum pouso certo, nenhum lugar para ficar – ou quase. Ele. O Tácio reserva. Júlio.

- Aí, Aldir, tudo bem, cara?
- Tudo. – Aldir mal tinha forças para falar, quanto mais ânimo.
- Aí, cara, olha só, eu tava pensando. Você acha que, por uma módica contribuição de cem reais, não tem um lugarzinho lá na casa para eu pôr o meu colchãozinho não? É que eu vim do Rio sozinho, não tenho onde ficar, e tava pensando se não teria um lugarzinho lá na casa para eu pôr o meu colchãozinho.
- Ih, Julio, não sei. Tem que ver se tem espaço lá na casa, se já não tem colchão em todos os cantinhos do chão. Vamos ver.
- Mas você acha que tem espaço?
- Sei lá, Julio. Não sei.
- Mas o que você acha? Tem ou não? Dá um palpite.
- Sei lá, Julio!
Ah. – e Julio, depois de um segundo de silêncio, foi cumprimentar os demais.


Som Abafado

Fim de dia no ginásio, as torcidas deixam o local, mas a festa não está encerrada. Hector, estacionado na frente do ginásio, abre a mala do carro e manda ver no CDzão de funk ao último volume. A mulherada vai ao delírio e se agrupa em derredor do Carro do Funk sacudindo o popozão, mexendo as cadeiras, quebrando as ancas lascivamente. Aldir, Zé e Hector ficam lá relaxando com a mulherada. Junta tanta gente no lugar que chega um fulano qualquer com uma caminhonete vendendo cerveja e estaciona bem atrás do carro de Hector, para ficar bem do ladinho de seus fregueses.

Aldir está sobre a calçada, bebericando sua latinha de skol numa boa, conversando animadamente em companhia de uma mulher. O funk é a trilha sonora deste antiqüíssimo ritual de corte e flerte, e a coreografia são mulheres de todas as faculdades batendo bundinha ao som de Glamurosa, Mc Marcinho. Estão lá entre risadinhas e gracinhas, trocando uma idéia, quando Aldir pensa ter percebido que o som do carro está meio abafado. Estranho. Dá um piparote do próprio ouvido, achando talvez que o exagero na bebida possa tê-lo entupido, mas nada. Uma luzinha vermelha se acende no cérebro de Aldir. Ele tenta, disfarçadamente, quebrar o pescocinho para o lado para ver o que estava exatamente acontecendo sem que sua companhia se sinta desprestigiada com a falta de atenção do interlocutor. Resta infrutífero o esforço. O sexto sentido de Aldir se aguça, pinicando-o por dentro. Algo está errado, muito errado. Entre a sobrevivência imediata e a mulher, Aldir caga para a conversa e vira para o carro, apenas para ver uma cena estarrecedora: o carro está com as portas e vidros todos fechados, e motor ligado, se preparando para partir! Aldir se desespera e sai correndo tal e qual um retardado, catando cavaco, pronto para se jogar na frente do capô. Chega junto à lataria e começa a esmurrar a porta, gritando em descontrole.

- Abre a porta! Eu quero entrar! Não me abandonem! Abre! Abre!

Ante ao lamentável papel a que Aldir se prestava, Zé é condescendente e abre uma frestinha do vidro do carona. O ébrio Aldir toma distância para pegar impulso na corrida e, no embalo, pular pela fresta para dentro do carro, caindo sobre o colo de Zé e do motorista. Não poderia falhar. Zé percebe a intenção e pára de abaixar o vidro. Bota a boca no pedacinho de fresta que ficou e solta a aterradora realidade.

- Aldir, você vai com o Júlio. – e, com medo da reação, fecha o vidro no mesmo instante.
- Não! Não! Nãaaaaaaaaaoooooooooooooo! – a verdade era dura demais e calou como uma pedra no coração de Aldir.

O carro de Hector parte em um piscar de olhos cantando pneus e acelerando para beeeem longe para fugir do passageiro extra, e Aldir, como os cachorros abandonados em filme, ainda vai correndo atrás, ainda gritando 'não, não, nãaaoooo!...', até que o carro se distancia. O som de funk que se desprendia da mala vai ficando cada vez mais longe, longe, longe, até sumir no horizonte. O pessoal que ainda estava por ali faz um 'aaaahhh' coletivo de frustração com o fim da festinha improvisada. Aldir se senta no meio-fio, põe o rosto entre as mãos e começa a chorar copiosamente. Surge Julio de alguma profunda sombra com o carro, abre a porta e fala para o desconsolado Aldir.

- Ô, Aldir, pode entrar! É o Julio, de Fortaleza! Eu pago a corrida!

Aldir, fazer o quê?, entra. Ainda fungando".

quarta-feira, 3 de março de 2010

Carnaval em Salvador - A Saga - Parte VII - Queimando a largada...

Título alternativo: "A Dança do Besouro"®.

Sexta-feira. Quase Carnaval. Clima de festa.
Tudo muito bom, tudo muito bem...

Hector e Lete, a essa altura, já têm companhia. E olha que não é uma companhia qualquer.

Com dezoito Carnavais nas costas, Besouro já sabe de cor o horário de todos os blocos, conhece todos os taxistas, dá dicas sobre a rota mais rápida, prediz o tempo pelo espessura do colarinho da cerveja, e conta histórias da época em que os trios ainda eram puxados por carroça.

Quando o conheceram, Hector e Lete nem imaginaram que Besouro, além de tudo isso, ainda tinha uma carta guardada na manga de seu abadá: a (ainda não) famosa "Dança do Besouro"®.

Os movimentos são muito mais difíceis do que qualquer Reboleichon; Besouro teve que repeti-la 387 vezes para que Hector pudesse, enfim, aprendê-la.

Aos corajosos que queiram se aventurar, eis o caminho das pedras:

INGREDIENTES:

1 mochila para líquidos, 2 litros de vodka, 12 latinhas de cerveja, 1 bandana vermelha, animação a gosto.

MODO DE PREPARO:

Antes do bloco: Abra uma latinha. Beba enquanto veste o seu abadá. Abra outra latinha. Amarre uma bandana vermelha na cabeça. Abra mais uma latinha. Beba enquanto não está fazendo nada. Abra outra latinha. Beba enquanto pensa nas últimas latinhas. Pegue as duas garrafas de vodka. Enquanto despeja todo o conteúdo de uma na mochila, beba a outra garrafa. Beba as outras oito latinhas enquanto os amigos estão se arrumando. Beba toda a vodka da mochila antes de o bloco começar.

Durante o bloco: Ande vinte metros. No meio da multidão, jogue-se de costas no chão. Enquanto cai, movimente freneticamente os braços. Ainda durante a queda, tente se agarrar a algum folião desatento. No chão, balance braços e pernas de forma totalmente descoordenada. Tente levantar. Desista. Tente novamente. Desista. Balance a cabeça quando falarem que você "queimou a largada". Ria. Deixe que o levantem. De pé, repita o movimento.

Depois do bloco*: Escolha dois baianos corpulentos para o carregarem até o táxi. "Voluntariamente"**, pague R$ 50 pra cada um. Use duas latinhas como muleta. Durma em frente à primeira porta que encontrar. Espere a chegada dos amigos.

No dia seguinte: Reclame de dor nas costas. Ria. Abra uma latinha. Mantenha a animação e o bom humor. Volte ao início.

(Homenagem ao Besouro, "amigo novo, parceiro novo"...)

* Segundo relatos.

** N.E.: As aspas, aqui, dão a entender que o autor está sendo irônico.

O meu "8 1/2"

Tac, tac, tac, tac, tac [passos]

[silêncio]

Onde é que eu falo? É aqu... iiiiiiiiiiiiircccccch [microfonia]?
Este troço está ligado?
Alô! Tuc, tuc, tuc. Alô! Aaaaa-lô!
Tesssssssssssstando.
Uh! Doih! Trêh!
Tesssssssssssstando.

Ok!

Grrrrtgrrruuuuuuuuuum [pigarro].

Bem, eu já sei o que você vai dizer...
E eu confesso: estive ausente.

Pensei até em inventar uma desculpa qualquer.
Falar - sei lá! - que comi um acarajé estragado e passei uma semana no banheiro.
Mas, neste tempo dos notebooks, palmtops e iphones, acho que até o papel higiênico deve ter acesso à internet.

Então, acho melhor falar logo a verdade.
E a verdade é que estou em uma severa crise de inspiração.

Agora mesmo, estou parado feito um paspalho em frente ao computador, e não sai nada.
Já tentei até brincar de caça-palavras no teclado (encontrei um "pô", um "oi", um "ui", e até um "tres" bem forçado).
Putz! Não acredito que você se deu ao trabalho de ir conferir!

É... Pelo visto, nunca vou conseguir terminar minha nona postagem.

Então, senhoras e senhores, voilà: eis o meu post "8 1/2"!