Qualquer escritor mequetrefe sonha em, um dia, escrever como seu grande ídolo.
Com Hector não é diferente...
Aldir Piscina. Já ouviram falar dele?
Tudo - absolutamente tudo - que se escreve aqui é uma imitação barata do estilo desse gênio da literatura jovem.
Duvida? Então, dê uma olhada:
"Profusão de Malas
Primeiro chegou o Bagunça, que surgiu primeiro como só uma cabecinha olhando para dentro da arquibancada, procurando por conhecidos, depois se animou e entrou saltitando como uma gazela com frio e praticando todos aqueles atos que tanto cobrem de vergonha a sua pessoa e embaraçam os seus amigos e conhecidos, como cheirar os cabelos das mulheres, comentar efeminadamente peças de roupas dos colegas machos ('aí, esse tom de púrpura com fúcsia não caiu bem em você!'), encostar-se a outros machos com abraços e afagos ao puxar papo e, hors-concours, arrozar a mulherada. Atrás chegou o Felipinho, que foi cumprimentar a sua fiel, Ju Pina. O pessoal ficou meio apreensivo, porque Ju tinha dito que seu outro namorado, um tal Moreno Alto, Forte e Sensual, estaria também nos Jogos – inclusive lhe mandara vários scraps no Orkut avisando – e o encontro de Felipinho e o tal Moreno Alto, Forte e Sensual, que já vinha se anunciando desde há muito, poderia acabar em pancadaria, com óbvias desvantagens para Felipinho. Depois chegou Paulinha Alexim, carregando vinte quilos de mala em cada mão e desviando bravamente de várias sovacadas dos torcedores que pulavam com os braços para o alto comemorando mais um gol. A tudo isso Aldir assistiu impassível. Mas não era tudo. De repente – não mais do que de repente – o olhar de Aldir é atraído para a entrada da arquibancada por um detalhe qualquer. No mesmíssimo instante, cruza o pórtico ele, que viria a ser a personalidade dos I Jogos Jurídicos do Sudeste; ele, que tanta diversão traria à galera; ele, que viera do Rio coladinho à traseira de Felipinho e Bagunça, os seguindo em seu carro com apenas um colchão na mala, poucas cuecas, uma enorme vontade de curtir a vida adoidado e absolutamente nenhum pouso certo, nenhum lugar para ficar – ou quase. Ele. O Tácio reserva. Júlio.
- Aí, Aldir, tudo bem, cara?
- Tudo. – Aldir mal tinha forças para falar, quanto mais ânimo.
- Aí, cara, olha só, eu tava pensando. Você acha que, por uma módica contribuição de cem reais, não tem um lugarzinho lá na casa para eu pôr o meu colchãozinho não? É que eu vim do Rio sozinho, não tenho onde ficar, e tava pensando se não teria um lugarzinho lá na casa para eu pôr o meu colchãozinho.
- Ih, Julio, não sei. Tem que ver se tem espaço lá na casa, se já não tem colchão em todos os cantinhos do chão. Vamos ver.
- Mas você acha que tem espaço?
- Sei lá, Julio. Não sei.
- Mas o que você acha? Tem ou não? Dá um palpite.
- Sei lá, Julio!
Ah. – e Julio, depois de um segundo de silêncio, foi cumprimentar os demais.
Som Abafado
Fim de dia no ginásio, as torcidas deixam o local, mas a festa não está encerrada. Hector, estacionado na frente do ginásio, abre a mala do carro e manda ver no CDzão de funk ao último volume. A mulherada vai ao delírio e se agrupa em derredor do Carro do Funk sacudindo o popozão, mexendo as cadeiras, quebrando as ancas lascivamente. Aldir, Zé e Hector ficam lá relaxando com a mulherada. Junta tanta gente no lugar que chega um fulano qualquer com uma caminhonete vendendo cerveja e estaciona bem atrás do carro de Hector, para ficar bem do ladinho de seus fregueses.
Aldir está sobre a calçada, bebericando sua latinha de skol numa boa, conversando animadamente em companhia de uma mulher. O funk é a trilha sonora deste antiqüíssimo ritual de corte e flerte, e a coreografia são mulheres de todas as faculdades batendo bundinha ao som de Glamurosa, Mc Marcinho. Estão lá entre risadinhas e gracinhas, trocando uma idéia, quando Aldir pensa ter percebido que o som do carro está meio abafado. Estranho. Dá um piparote do próprio ouvido, achando talvez que o exagero na bebida possa tê-lo entupido, mas nada. Uma luzinha vermelha se acende no cérebro de Aldir. Ele tenta, disfarçadamente, quebrar o pescocinho para o lado para ver o que estava exatamente acontecendo sem que sua companhia se sinta desprestigiada com a falta de atenção do interlocutor. Resta infrutífero o esforço. O sexto sentido de Aldir se aguça, pinicando-o por dentro. Algo está errado, muito errado. Entre a sobrevivência imediata e a mulher, Aldir caga para a conversa e vira para o carro, apenas para ver uma cena estarrecedora: o carro está com as portas e vidros todos fechados, e motor ligado, se preparando para partir! Aldir se desespera e sai correndo tal e qual um retardado, catando cavaco, pronto para se jogar na frente do capô. Chega junto à lataria e começa a esmurrar a porta, gritando em descontrole.
- Abre a porta! Eu quero entrar! Não me abandonem! Abre! Abre!
Ante ao lamentável papel a que Aldir se prestava, Zé é condescendente e abre uma frestinha do vidro do carona. O ébrio Aldir toma distância para pegar impulso na corrida e, no embalo, pular pela fresta para dentro do carro, caindo sobre o colo de Zé e do motorista. Não poderia falhar. Zé percebe a intenção e pára de abaixar o vidro. Bota a boca no pedacinho de fresta que ficou e solta a aterradora realidade.
- Aldir, você vai com o Júlio. – e, com medo da reação, fecha o vidro no mesmo instante.
- Não! Não! Nãaaaaaaaaaoooooooooooooo! – a verdade era dura demais e calou como uma pedra no coração de Aldir.
O carro de Hector parte em um piscar de olhos cantando pneus e acelerando para beeeem longe para fugir do passageiro extra, e Aldir, como os cachorros abandonados em filme, ainda vai correndo atrás, ainda gritando 'não, não, nãaaoooo!...', até que o carro se distancia. O som de funk que se desprendia da mala vai ficando cada vez mais longe, longe, longe, até sumir no horizonte. O pessoal que ainda estava por ali faz um 'aaaahhh' coletivo de frustração com o fim da festinha improvisada. Aldir se senta no meio-fio, põe o rosto entre as mãos e começa a chorar copiosamente. Surge Julio de alguma profunda sombra com o carro, abre a porta e fala para o desconsolado Aldir.
- Ô, Aldir, pode entrar! É o Julio, de Fortaleza! Eu pago a corrida!
Aldir, fazer o quê?, entra. Ainda fungando".
quinta-feira, 4 de março de 2010
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário