terça-feira, 26 de outubro de 2010

As rotações

Lembro-me de quando aconteceu.

Meu pai chegou em casa com aquele trambolho que, com mais ou menos cem metros de fios, deveria conectar-se à parafernália de som (de última geração, na época).
Junto com ele, dois disquinhos reluzentes de um brilho estranho, arco-irizado.

Isso foi há o quê? Quinze anos?
Mas é engraçado como ainda os tenho na memória: um do Caetano, um da Maria Creuza.

Eram tão diferentes daquelas bolachonas pretas que dava até medo de tocar. Deram-me as instruções: pegar pelas beiradas, apertar a caixa no meio, eject, põe o disco, eject de novo, play, e voilá: estava feita a mágica.

Não gostou da outra música? Clique, e já estava lá, de novo na sua preferida.

Mas não é bem sobre o meu primeiro dos muitos contatos de quarto grau com esses alienígenas que eu queria falar.
Não. A ideia é dividir uma conclusão (angústia?) a que cheguei faz um tempinho.

Sou de uma geração – e com uma boa probabilidade, vocês também – que vivenciou um grande salto na teconologia: do LP aos nano-MP18 (opa!, já lançaram um MP19).

E não nos enganemos: isso envolve também, necessariamente, uma mudança de postura.
Somos a causa-consequência dela. Orgulhamo-nos da revolução, mas geralmente preferimos empurrar a segunda para baixo do tapete.

Ora, antigamente, tínhamos só duas opções para satisfazer nossa sede musical.

A primeira é uma das reminiscências mais prazerosas da minha infância (e prepare-se, porque se é da sua também, você se sentirá tão velho quanto eu).
Lembro que eu passava o dia todo com o rádio ligado, dedo no botãozinho vermelho, esperando o momento em que tocariam AQUELA música. Milésimos de segundos preciosos diferençavam um medíocre de um popstar nas festinhas do condomínio.
Pouco importa que a gravação viesse entremeada de infindáveis samplers com o nome da rádio, anúncios, chiados. Aquele que tinha em mãos as músicas completas podia escolher o seleto rol de amigos a quem permitiria copiá-las. E, provavelmente, também a menininha com quem trocaria beijos rituais e burocráticos em algum lugar um pouco mais escuro do playground ou da rua.

Havia também, é claro, a possibilidade de se comprar os discos.
E aparecer com um “Rap Brasil” embaixo do braço tinha mais ou menos o mesmo efeito que hoje tem uma chegada num carro importado: os meninos o tachariam logo de gordo brocha, e as meninas, de “interessante”.

Enfim, de um jeito ou de outro, era muito mais difícil ter acesso aos hits.
Deixando de lado a primeira possibilidade, ainda assim restaria aos mais afortunados apenas um jeito de ouvir a mesma música várias vezes na sequência: levantar a bunda da cadeira e, depois de contar, linha a linha, apontar novamente a agulha para a listra exata.
Convenhamos: depois de fazer isso dez vezes, ou os vizinhos chamavam a polícia ou a pessoa se estatelava no sofá, e terminava de ouvir o disco.

Hoje é tudo muito mais fácil, e não é só por causa da abençoada invenção do controle remoto.
No fim das contas, a gente acaba ouvindo só as músicas que quer (quando, claro, não é vítima dos desagradabilíssimos difusores do mau gosto, que provavelmente em conchavo com o Coisarruim insistem em nos atazanar com seus carros e celulares).

E aí até dá pra entender essa extratemporalidade excessiva do gosto bizarro das crianças e adolescentes de hoje em dia.

Se eu tivesse um i-qualquercoisa na época, possivelmente passaria o tempo todo ouvindo Xous da Xuxa e outras bizarrices mais - o que equivale mais ou menos aos Luans Santana de hoje em dia.

E o mais importante: com certeza, não teria tomado gosto por todos os rostos que, na capa, escondiam daquele petiz as boas músicas das minhas sagradas e salvadoras bolachas.

segunda-feira, 25 de outubro de 2010

Cadê a câmera?

Que o romantismo há muito já foi pro beleléu, todo mundo já sabe.

Mas acho que pouca gente notou que estamos chegando num ponto crítico, numa esquina dos tempos... É chegado o momento em que a noção do ridículo nos flertes será, de uma vez por todas, declarada extinta.

Eu sei que você já deve estar aí, na sua, rindo.
Se você é mulher, aposto que lembrou de mais de dez cantadas daquelas que fazem pensar “Porra! Como você é mongolóide...”

Mas eu preciso dividir alguns fatos que presenciei num passado recente.
Por favor, leiam, ainda que seja só por educação.

Outro dia, por exemplo, ouvi um indivíduo lançar a seguinte pérola: “Ei! Você é de escorpião, né?”, seguida de um “É que meu signo combina mais com peixes”.

Vendo que o papo não vingava, resolveu utilizar alguma das técnicas que aprendeu num livro do tipo: “Como puxar assunto com garotas (se você realmente gostar de garotas)”.
Revisou mentalmente, e puxou a regra número um: mostrar-se interessado pela vida dela.
Com toda a sua criatividade, o máximo que conseguiu perguntar foi: “Você gosta de ser ruiva?”

Tsc, tsc, tsc...
Melhor sorte da próxima vez, valente guerreiro.

É de dar pena? Sim, não há dúvidas.

Mas aposto que se o paspalhão aí de cima tivesse visto o que eu vi na última quinta, sairia por aí com uma flor na boca e uma máscara de Don Juan.

Showzinho tranquilo, tudo em paz.

Um sujeito para ao lado da menina, olha, analisa, sorri, e lança todo o seu veneno num bote ofídico: “ié-ié”.
Assustada, a menina vira os olhos suplicantes para as amigas, implorando ajuda.
Pobre garota... É tarde demais.
As amigas, a ponto de perderem o ar de tanto rir, obviamente não têm forças pra barrar a cena. Pra falar a verdade, nem querem; o ser humanos às vezes é mau.
Quando ela olha para a frente novamente, toma um susto: o sujeito já ali, cara a cara, dando golpes de Serginho Malandro aos berros de “ié-ié, ié-ié”.

Como que implorando por um tiro de misericórdia, ela pergunta:
- O que você quer?
- Um beijo, ié-ié!

Corre o boato de que ela agora não sai mais de casa.
Desiludiu-se com a humanidade.

Andiamo!

Ela não era perfeita, mas ele sabia que era muito mais do que poderia esperar.
Bonita a ponto de fazer cabeças virarem, independente, inteligente. E o mais impressionante: ou ela fingia muito bem, ou então realmente interessava-se por aquelas suas infinitas dissertações sobre os assuntos mais chatos do mundo.

Por mais de uma vez ela chegou a repreender os amigos dele. Onde já se viu? Desde quando uma discussão sobre as influências de Godard sobre o cinema pós-contemporâneo egípcio era motivo pra riso?

Ele estava feliz, enfim.
Não tinha motivos para reclamar.

E o festival veio bem a calhar: desde que começara a estudar italiano, ele tinha passado a se interessar por aqueles filmes.
Era uma boa chance de impressioná-la. “Fazer a tchutchuca ficar pirada no papai aqui”, como constumava dizer.

Discorreu longamente. De Rossellini a Fellini, passando por de Sica.
Falou tão bonito, que ela até entrou animada (ou fingiu muito bem) na sessão.
E gostou mesmo do filme.

No final, com as letras ainda correndo, e depois de uns rápidos amassos, ele achou que havia chegado o momento de fechar com chave de ouro.
Forçando ao máximo um sotaque siciliano, sacou aquela frase que tanto havia ensaiado: “Andiamo!”

Não sei se foi por causa do barulho ou da emoção, mas ela acabou escutando um equivocado “te amo”.

Nunca mais saíram juntos.

terça-feira, 19 de outubro de 2010

Naftalina III

O que poderia ser diferente?
Tudo? Não, acho que há uma parte de todos nós que não mudaria, independentemente de qualquer decisão ou circunstância.
Quase tudo poderia ser de outro jeito, então.

Remexi nos armários da minha antiga casa.

Se eu fosse brega, lembraria de alguma música, e diria que joguei tanta coisa fora e vi meu passado passar por mim.
Não sou. Não esperem isso de mim. Recuso-me!

Mas no meio de tanto passado, encontrei mesmo muita coisa que me fez lembrar de tantas outras. Símbolos empoeirados de acontecimentos dos mais variados tamanhos, dos mínimos aos enormes.
Como cheguei a tornar-me eu?

Ri muito. Ri tanto... Ri mesmo do que antes me fizera chorar.

Não dá pra dizer que senti saudade. Em nenhum momento quis voltar no tempo.
(Acho que ele finalmente começa a me dar aulas sobre os infinitos modos de sentir.)

É só um prazer preguiçoso de contemplar esse alguém que fui, e que às vezes nem parece tanto assim comigo.

Se eu pudesse, guardaria tudo aquilo dentro de mim, e levaria pra onde quer que fosse.
Não posso...

Não levo comigo os papéis, mas carrego aquelas amizades, aqueles bons momentos, aquela felicidade tão louca que não dá nem pra descrever.

O que é isso? Não sei.
Mas é bom, muito bom.

E cheira à naftalina.

Naftalina II

Antes, porém, sobrevoei um passado mais recente, e também mais feliz.
Duas pontas daquela minha vida, separadas por uma baía de distância.

Como opção ao trânsito caótico da Ponte Rio-Niterói, as barcas, aqueles monstros, projetos de sucata que insistem até hoje em zanzar, devagarzinho, de um lado a outro.

E de um lado a outro meu corpo zanzava também, refém de uma vontade vacilante, ou ao menos não tão forte a ponto de se impor.

Quantas vezes saí correndo do trabalho e, catando o bilhete na carteira e esbarrando com a mochila em passageiros incautos, pulei a bordo no último instante, no tempo certo e medido de afrouxar a gravata ao som do silvo de partida.
Dali em diante, uma paz de vinte minutos com a cidade maravilhosa, luzes acesas, como pano de fundo.

Nem sei como aqueles bancos de madeira – tão frágeis, à primeira vista – sustentaram o tanto que refleti sobre a minha vida, e o peso das decisões, algumas das mais importantes. Sou capaz de lembrar de mais de uma dezena das que tomei ali, olhando para o rastro branco deixado à ré, ao som das ondas batendo no casco.

Não guardo todas na memória (e nem seria capaz), mas isso de forma alguma me nega o direito de ainda sentir o gosto doce a contrastar com o salgado do mar.

Penso no quanto eu seria diferente, não fossem tantos os bons conselhos.

Cruel destino: foi ali que decidi meu caminho. Este mesmo, que hoje passa por aqui, longe, muito longe dela.

Aldir, acho que só você me entenderá...

segunda-feira, 18 de outubro de 2010

Naftalina I

Sabem? Às vezes, tenho aquela vontade adolescente de subverter a ordem.
Então hoje farei algo diferente: não deixarei em suspenso a explicação do título; começaremos por ele.

A crônica é tão radicada no tempo, que a própria palavra é derivada de Cronos.
E nada melhor para simbolizar a parte mais saborosa do tempo – o passado – do que aquele cheirinho de camisa tirada do fundo do armário. Aquele mesmo que invade o ar toda vez que o Fluminense consegue mais uma escapada rara e milagrosa do rebaixamento: a naftalina.

Pronto! A inversão foi proposital.

Dada a explicação quanto ao título, ninguém mais está obrigado a ler o texto até o final.
Quero que fiquem só os amigos mais chegados. Afinal, estamos todos a meio salto de um mergulho profundo na minh’alma.

Digo – e se alguém discordar, que cale, a bem da argumentação – que são poucos os que têm a oportunidade de passar tão perto de um “quase futuro” como eu.

E o “quase futuro” significa mais que uma probabilidade.
Era uma certeza, que só não chegou a acontecer porque consegui intervir no tempo certo de salvar minha pobre existência daquele porvir garantido e sem surpresas, daquela vida toda modulada dali até o fim.

Aconteceu na última quinta-feira.
Coisa rápida: os segundos exatos de um pouso na curta pista do Santos Dumont.
Mas lá estava ela, muros caiados ajudando a esconder o que eu varri há muito pra debaixo do meu tapete: a Escola Naval.

Hoje, a resposta me vem fácil, mas naquele tempo de dúvida e disciplina severas, as perguntas torturavam. E muito!
O que tinha eu a fazer em meio a toques de corneta de madrugada, rações mal ajambradas de comida e absoluta ausência de companhias com saias (e com tudo que há além delas)?

Acreditem quando digo que foram anos difíceis.

Só com muito esforço consigo lembrar do que na época sentia, alijado súbita e precocemente de uma infância mal acabada (ou de uma adolescência mal começada, como prefiram).

Tempos que serviram para me ajudar a descobrir que tratar garotos como homens não os torna homens.
Ao contrário: torna-os garotos arrogantes a ponto de tentar fazer de outros, tão garotos como eles, algo cujo significado – e consequências – eles nem sequer imaginam.
E não é nada difícil encontrar garotos de vinte, trinta, quarenta, cinquenta anos, brincando de educadores.
Conheci poucos, pouquíssimos, dentro do Colégio Naval que tivessem uma noção minimamente digna e coerente do que é a hombridade.
E tomei-os como o exemplo claro de que a influência do meio sobre nós é sempre temperada pelo caráter.

Ainda assim, repito: não há nada, absolutamente nada, que me faça ressentir tudo que se passou. E no “nada” incluo as formações infindáveis, as humilhações (muito) mal disfarçadas de brincadeiras, o descuido criminoso com a saúde, a irresponsabilidade no ensino e todo tipo de tortura psicológica que salpicava o abominável dia a dia na caserna.

Não minto ao dizer que, por mais que me esforce – e reconheço que a afirmação parecerá contraditória –, não consigo espanar a capa de nostalgia que cobre essa parte do meu passado.
Sobre tudo (e sobretudo), fica sempre a única herança positiva daquela vida de privações: as amizades.
Juro que nunca mais encontrei aquela cumplicidade, tipo de coisa que só existe quando uns poucos guerreiros sustentam, cada um na medida de sua força, o peso do mundo.
Nada de classis spes. “Nós poucos contra a corporação” era o absurdo lema oculto que nos fazia ao menos caminhar até a tão sonhada sexta-feira; ela que trazia – na maioria das vezes, a depender da escala de serviço – os dois santos dias de alforria com hora pra acabar.

Certa vez ouvi alguém comentar que o “Colégio Naval seleciona os melhores”. É a típica frase de um típico medíocre vestido de barretes, nós e estrelas.

Mas prestemos continência à incoerência.
Isso basta para satisfazer os egos inflamados e fardados.

quarta-feira, 13 de outubro de 2010

“O mendigo e o milionário” (ou “Em quem votarei nestas eleições”)

O mendigo e o milionário encontram-se no sinal. É o dia do aniversário de ambos. Quarenta anos, pode ser? (Podem mudar a idade, se quiserem; não importa...)
Digamos que nasceram exatamente no mesmo dia do mesmo mês do mesmo ano, e estamos conversados. Se você acreditar em papai noel, duendes ou signos, afirmo que os dois, mendigo e milionário, são de escorpião rosa-choque com ascendente em pônei manco africano.

Posto o quadro, faço a pergunta: quem tem mais mérito por estar vivo? Um, por ostentar três pontes de safena (resultado praticamente inevitável de mais de vinte anos de estudo – árduo e sério – e de uma rotina de trabalho escravo-contemporânea)? Ou o outro, por sobreviver tanto tempo com um suprimento inacreditavalmente baixo de tudo quanto é necessário para manter a vida até de um recém-nascido?

Sinceramente, não sei.

Se a pergunta fosse colocada de outra forma, no tempo exato de segundos que dura a cor vermelha do sinal, não teria dúvidas em responder: “ora, mais do que ter as oportunidades na vida, é preciso aproveitá-las”.

Mas aí penso: será que sou imparcial o suficiente? Ou eu estou simplesmente encarnando a problemática, pra afirmar que tive, sim, as chances – é inegável – mas não tirem meus méritos por tê-las aproveitado?

Neste sentido, sinto-me muito mais próximo do primeiro (exceto na parte do milhão, vejam bem).

Só que não me permito mais essa mentalidade liberal que iguala milionários e mendigos.

Mendigo e milionário no Brasil são, desde o berço (aos felizardos que o têm), seres tão diferentes que quase se pode dizer que não são da mesma espécie: há, perdoem o mau latim, o homo brasileirus pobris e o homo brasileirus ricus.
Às duas se dá o direito de sonhar, só a uma o de realizar.
Só uma delas – adivinhem qual! – ganha por herança terras, boa educação, saúde, cultura, posição social

Sei que, neste momento, vocês estão se perguntando: aonde isto aqui vai chegar?
E a partir de agora tento esclarecer.

Demorei tempo demais pra me convencer da justiça e efetividade de algumas políticas, dentre elas a cota nas universidades e os programas assistencialistas (sim, falo mesmo do Bolsa Família).

Jurei que, nestas eleições, não tomaria partido (com “pê” minúsculo, mesmo, porque nos “pês” maiúsculos já não tenho mais qualquer confiança nem esperança daquelas infanto-estudantis).

De comum nesses dois parágrafos aí de cima, a inércia. E, cá entre nós, no fim das contas não sair de cima do muro já é uma escolha, ainda que a mais hipócrita e vergonhosa delas.

Ora, antes que se discuta qualquer projeto sério de país (ou de qualquer outro ambiente social, micro ou macro) é necessário antes de tudo que sejam todos minimamente educados, que tenham uma condição digna de saúde, e, o mais importante: que estejam de barriga cheia.
Devem receber ajuda em troca do quê!? De nada. Tudo pela simples condição de serem humanos.

E aqui ligo todas as pontas deste texto esquizofrênico: simplesmente não pode haver a opção de não salvar os miseráveis.
Duzentos reais pra encher o próprio bucho e o da família. É pouco? Muito? Distribuído de forma errada? Tem fraude? Tudo deve ser revisto, mas não dá pra negar que o assistencialismo é ainda necessário no Brasil. E será por muito tempo.

Detesto o PT tanto quanto detesto o PSDB. Como diria Aldir, não teriam meu voto nem para síndico do prédio (e me refiro a praticamente todos os “pês”, todos eles iguais, os que não são piores), mas tenho a certeza de que “nunca na história deste país” a questão da desigualdade foi discutida tão amplamente pela sociedade. E já é um projeto vencedor, tanto que nem sequer a direita – se é que já não viraram todos ambidestros – ousa propor uma mudança radical.

Nem Dilma nem Serra estão à altura de dirigir o Brasil da maneira como ele precisa. Juro que levo um susto toda vez que, distraído, olho pra um dos dois sorrisos (e espero que todos entendam que digo isso por metonímia). Ambos são, na minha opinião, ruins. Muito ruins!
(Para não deixar dúvida: o Lula também está nesse mesmo grupo.)

Mas, na falta de terceira opção, votarei pela continuidade de um projeto que, se não mudou o país, ao menos colocou o primeiro tijolo.
O caminho está errado? Talvez. Só que ao menos já estamos olhando para o lado certo. “Pela primeira vez”, se conheço bem esta Pindorama.

De todo modo, torcerei (e muito) para que a sociedade já tenha adquirido maturidade suficiente para que, caso no final vencida a situação, possa freiar a reentrega do poder absoluto aos homo ricus, ao milionário.

Pronto. Para o bem ou para o mal, não me permitirei calar. É este o meu voto: Dilma.
E com isso não pretendo afirmar que outro voto, talvez o seu, esteja errado.
Já ficarei feliz se todo mundo se propuser a, no mínimo, pensar melhor sobre o assunto.

Ah! O sinal já abriu faz tempo, mas continuo envergonhado (de mim) por saber que vivo num mundo onde ainda existe a fome. E que ainda há gente que não põe o problema como absoluta prioridade.

terça-feira, 5 de outubro de 2010

Avante, HTR!

Que fique bem claro: não tenho absolutamente nada contra.
Admito que ainda fico um pouco constrangido... Mas, pelo andar da carruagem, é bom que se saiba que qualquer bípede que queira manter uma vida social saudável num futuro próximo precisará acostumar-se a um convívio, digamos assim, sexualmente democrático.

Só que bem que podiam ter me avisado.
Se eu soubesse que o lugar era desse jeito, ao menos não teria posto aquela minha camisa do “Peru Wars”.
Pegou mal! Muito mal...

Aliás, logo que cheguei, já fiquei meio na dúvida.
A primeira coisa que vi foi uma mão peluda em cima de um ombro peludo.
“Opa! Peralá. Será que entrei no lugar certo?”

Mas eles estavam lá: Juan e Dan Catupiri, acuados no canto, formavam o reduzidíssimo núcleo hetero do quiz.

Pensei em dar meia volta e sair correndo, mas os quatro braços içados em movimentos frenéticos já denunciavam que eu tinha sido visto.

Não sei quem fui que deu a brilhante ideia de afirmar, no nome do grupo, nossa ortodoxa opção sexual: HTR. Imperceptível, né?
Mesmo assim houve um arremedo de preocupação no grupo: “Se vierem bater na gente, eu digo que o R é porque eu me chamo Ruan!”, foi o que se ouviu.

Pois bem. Começada a apuração, veio uma sequência ininterrupta de comemorações coreografadas e gritos em falsete.

Para surpresa geral, a equipe vencedora da primeira rodada, com esmagadora vantagem, foi a... HTR!
A bem da verdade, graças a Juan (com J ou R, tanto faz), nosso grande guru da cultura útil e inútil (alguém mais sabe os nomes das filhas da Baby do Brasil?*).

Anunciada no microfone, durou cerca de dois segundos a sutileza da piada:
- HTR? Será que é de hetero??? – levantou-se uma voz.
- R é de rosca! – gritou outra, visivelmente perturbada.

Pior pra Ruan... Foi o R dele que foi pra berlinda.



* Ele sabe: Sara Sheeva, Nãna Shara e Zabelê.

segunda-feira, 4 de outubro de 2010

Um uiquéndi com vocês - Parte X - caradepau.com

Quem gosta de Seinfeld bate aqui!
Uhu! Sabia que vocês não iriam me decepcionar...
Este aqui é mesmo o império do bom gosto.

Pois naquele momento, estávamos mesmo falando sobre aquele episódio em que o Jerry esquece o nome da mulher com quem está saindo.
Depois de tentar tudo quanto era possível para descobrir, ele tenta a sorte. E erra.

E vocês? O que fariam?
Era exatamente a discussão que rolava ali.

De repente, não mais que de repente, ouve-se aquele “plic”. Inconfundível: caiu alguma ficha.

Uma pessoa que eu não digo quem é nem que me cortem o pescoço [passando o indicador horizontalmente na garganta, apontando pra Hermana] começa a perceber que aquilo poderia, sim, estar acontecendo com ela.

Rá, rá, rá... Risadas gerais.
Seria mesmo verdade?

Hector comenta, só por gaiatice:
- Só falta ele mandar uma mensagem pedindo o seu e-mail...

Rá, rá, rá, barulho de mensagem: “Oi, princesa! Me passa o seu e-mail.”

Ah!, não...
Aonde este mundo vai parar?!

Só pra deixar registrado: Hector jamais esqueceria o nome de vocês, meninas!

Um uiquéndi com vocês - Parte IX - Love is in the air

Não vou mentir.
Quando o garçom falou que a mesa teria que ser dividida com outros dois casais, vi que Hermana e Senquévis torceram o nariz.
Mas eu já conhecia a picanha do lugar, e a minha fome não estava dando muita brecha para negociações. Ainda menos se tivessem alguma coisa a ver com atraso.
Assumi o risco pela decisão unilateral, enfim.

E não é que foi bom?

Começamos com as bebidas, e logo interceptamos um papo interessantíssimo: quando eu namorava a Marcinha, blablablá, quando eu namorei a Paulinha, blablablá, uma vez eu saí com a Fernandinha, blablablá.
Sem dúvida, ali havia potencial para um bom barraco!
E não deu outra: “Caceta! Eu não sabia que você era tão galinha!”!

Rá, rá, rá.
Nada como um bom escândalo pra abrir o apetite.
Dá um alívio... A gente sempre pensa: “que bom que não sou eu que estou levando esporro!”

E não é que aquela mesa ainda guardava mais surpresas?

Todo mundo já de pança cheia, e o outro “calsalzinho” ali do lado, só de amores:
- Óun, meu cuticuticuti, quer uma sobremesinha – dizia ele, falando com a namorada como se fosse com um bebê.
- Aí, eu vô engodá e você vá me trocá – respondia ela, fazendo beicinho.

Aquela típica conversa irritante que causa em qualquer ser com o mínimo bom senso uma repulsa invencível. Além da tradicional vergonha alheia, por supuesto.

Mas sou capaz de apostar que o diálogo no carro não teve tanto gutiguti.

Isso porque, na hora que a pobre menina foi levantar, deu uma cabeçada sonora no teto (que, atrás dela, não me perguntem por que, fazia um “v” com a parede).

E o namorado? Correu pra ajudar? Que nada!
Soltou só um: “Car&*$%! Eu não disse pra tomar cuidado sua... sua... sua...” (o restaurante todo olhando, na expectativa) “sua... tapada”.

Foi tanto tempo pensando no adjetivo, que eu fiquei na maior curiosidade de saber o que tinha vindo primeiro na cabeça dele.
Até porque, se terminou no “tapada”, devia ser coisa quente!

O que aconteceu com eles, não sei.
A última cena que eles nos proporcionaram foi uma esquivada acrobática de um beijo potencialmente apaziguador.
Mas digo que não vou me surpreender nada, nada, se ela já estiver fazendo beicinho pra outro.

La dolce vita

Hoje foi um dia histórico.
Peguei todos os sinais abertos, de casa ao trabalho. Sete ao total.

Não me lembro de nenhuma vez em que isso tenha acontecido comigo.

Agora, minha natureza cética me impede de ver qualquer sinal nesses sinais.
Mas devo confessar que antes de ligar meu interruptor de bom senso, quase cheguei a acreditar em uma força metafísica manipulando os controles de engenharia de tráfego.

Nem tanto por causa da agradável coincidência (que me economizou uns cinco minutos); acho que mais porque eu simplesmente não posso negar que sopram bons ventos.

E aí, penso cá com meus botões: são sempre os meus textos que aturam meus maus momentos, meu sarcasmo às vezes nada amigável, e todos os meus “ene” jeitos de desabafar.
É justo então que eu preencha pelo menos algumas linhas com uma modesta felicidade.

Nenhum acontecimento excepcional.
Não ganhei na loteria, não fui promovido, meu time tem levado mais gols do que marcado. Não recebi declarações de amor, não fui eleito mister universo. Nem mister país, nem estado, nem cidade. Acho que nem sequer mister meu quarto.

Mas me sinto bem comigo e com os de quem eu gosto. E mesmo com os que amo (e olha que sou bastante exigente no particular).

Por quê?
Sei lá! Tudo passou a fluir bem.
Ou talvez nada tenha mudado, exceto eu.

Aliás, não estou me importando muito em procurar explicações.

E o meu café?
Sem açúcar, por favor. De doce, já basta a vida.