domingo, 15 de agosto de 2010

O que é a felicidade?

Sentimentos são abstratos, mas o homem é humano demais para não os ver, tocar, sentir, cheirar, ouvir.

Eu, por exemplo, me vejo feliz no campo.

É engraçado, porque não gosto de insetos.

E também porque eu sempre fui da cidade.
Aliás, a fase mais bucólica da minha existência foi um sequência mais ou menos periódica de visitas à casa de campo da minha avó paterna, encerrada precocemente depois de encontrarem uma cobra (de verdade) no quarto. Ela obviamente ficou - a cobra, não a minha acó -, e todos saíram correndo às pressas, pulando num Fusca azul já em movimento.

Pensando bem, deve ser exatamente por isso: o fascínio pelo desconhecido.
Não é isso que vira e mexe se costuma dizer?
Sei lá.

Mas é um fato. Pensar na minha felicidade é pensar num relvado verde, infindável, com crianças ainda sem rosto – filhos, sobrinhos, netos? –, brincando em suas roupas de um branco tão branco que nem sequer pode existir.

Ninguém nunca precisa acender as luzes.
O sol ilumina o tempo todo (e só chove de tempos em tempos uns chuviscos daqueles que um banho de mangueira nunca poderia substituir).

Uma parede coberta de fotos.
Família e amigos.
Os que foram, os que são, os que sempre serão.

Diplomas, roupas de festas, abraços, pessoas fingindo olhar alguma paisagem mundo afora, um cachorro lançando milhões de microgotículas de água depois de se sacudir por causa de um bom banho...

“Lembra do fulaninho? Hahaha! Olha como ele era magro...”

Talvez do lado oposto, talvez em outro lugar totalmente diferente, uma biblioteca.
Livros organizados por ordem alfabética de título. Ou de autor. Ou por assunto. Ou por qualquer outra ordem maluca que uma vontade pré-senil queira estabelecer.

Não, não, não... Bagunça completa!
Alguns espalhados pelo chão, outros caídos nas prateleiras. Pra cada vez que se precisar procurar alguma coisa, vê-los todos. As letras da capa fazendo lembrar cada uma das vidas vividas.

(Acho que vou deixar esta parte em aberto, pra decidir mais tarde.)

Vez por outra, uma carta numa caixa ou uma dedicatória numa página amarelada trazendo de volta um amor natimorto.
E fazendo surgir aquela coisa esquisita que fica extamente no meio do caminho entre bufar e sorrir, e que absolutamente não dá pra explicar.

Uma poltrona e um abajur.

Na sala, amigos e música. Conversas. Risos das estórias daquela juventude há muito passada, e também de outras juventudes, mais novas, menos compreensíveis.

Uma mão carinhosa no cabelo; no rosto; no braço. Em qualquer lugar onde eu possa senti-la e dizer pra mim mesmo: “Ufa! Está aqui”.

O que é a felicidade, afinal?

Não conheço a sua.
Pode ser – e é bem provável – que não haja crianças, livros, sóis que nunca se põem, mãos e abajures.
Pode ser que a minha felicidade seja só o ideal barato de comercial de sabão em pó.

Pode ser, pode ser, pode ser.

Mas pra onde vamos?
O que fazemos nesse ciclo que vai de domingo a sábado, de janeiro à dezembro, do nascimento à morte?

Ah!, a felicidade...
Vivemos para ela, mas nem sabemos o que ela é.

4 comentários:

  1. É tudo isso junto. É construída, todos os dias, a cada dia, a cada minuto. É tão grande que não cabe em um momento só... Mas a sua descrição está bem BONITA!

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  2. Aldir, fã de fotos contemplativas16 de agosto de 2010 às 08:46

    "pessoas fingindo olhar alguma paisagem mundo afora", uhuhu.

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  3. Existe sim, Vivs!
    Encontro com ela todos os dias...
    Aliás, ela mandou um abraço, e pediu pra perguntar se quer que reserve um lugarzinho no quadro de fotos pra você!


    Só há uma coisa BONITA aqui, é não é a descrição.
    (E você sabe que "bonita" é o elogio máximo, né?)


    Aldir,
    Nem me venha com chorumelas. Você sabe que eu domino a técnica contemplativa como ninguém...

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