terça-feira, 14 de setembro de 2010

Modéstia à parte, meus senhores

Bem que eu gostaria de poder dizer: “nasci lá”.
Mas não posso. A verdade e uma certa dose de preciosismo me impedem.

Infelizmente, não sou mais daquele tempo em que as pessoas vinham ao mundo nas suas casas, e décadas depois ainda podiam dizer com uma pontinha de orgulho: “nasci e cresci aqui”.
Davam a impressão de querer mostrar que eram fiéis a um não sei o quê, assinando a obra em conjunto com o acaso: "por que não nasci em outro lugar? Por que não quis, oras. Ah! Houve também o destino, mas não faria diferença, mesmo."
Mas era bonito... Sem dúvida, era bonito.

Não. Como a grande maioria de vocês – se não todos – nasci na maternidade.
Mas posso assegurar-lhes: logo que os médicos concluíram que a minha frágil respiração e meus incipientes batimentos de neófito eram suficientes para encarar as crueldades do mundo, fiz(eram - meus pais, não os médicos) daquele lugar minha morada.

Dispensável dizer que esse meu curto período experimental no berçário não afetou em nada este meu orgulho suburbano.

Suburbano porque a Vila (e não me obriguem a completar com o Isabel, porque soa como uma formalidade que eu em absoluto não tenho com ela) fica no subúrbio.

É um lugar que nasceu quilombo, e isso diz muito.
É preta. É linda...

Talvez por isso seu ritmo, inigualável.

A parada de ônibus em frente ao Petisco, um lanche no Ponto de Cem Réis, a fábrica de tecidos, que eu cruzava todos os dias... Tudo parte da minha criação.
E era bom andar por lá vendo música concreta em cada canto daquele cotidiano.

As calçadas da Vila são partituras (e não é só metáfora).

Foi sobre elas aliás que tive a primeira amostra de tudo o que a vida depois me enfiaria goela abaixo em doses adultas, às vezes até cavalares: guerras, paz, conquistas, decepções, amigos, amores. E, é claro, o samba.

De tudo nesse meu destino, só uma queixa: por que não no tempo de Noel? Quem sabe até uma parceria eventual numa noite qualquer de boemia...

5 comentários:

  1. Talvez porque... naquela época ainda se morresse de tuberculose?

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  2. Mas Noel, com certeza, está lendo seu blog de algum lugar... (frase de efeito sem sentido).

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  3. Aldir,
    Quer parar de estragar minhas memórias de garoto?
    Vou ter que afogar em espumante essa sua inveja de meu passado suburbano?
    Quero ver você falar sobre aquela sua infância logosófico-traumática! hehe

    Anônimo,
    Ouvi dizer que ele é um dos seguidores-fantasminha aqui do lado ===>

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  4. Com certeza, se tivesse nascido e se criado na Vila, com esse coração de sambista e após uma noite de boemia com Noel, você diria: "naIsci e cresci aqui" rsrs
    Essa sua descrição da Vila me fez lembrar de uma música que James Taylor escreveu quando conheceu o Rio: "...samba floating in the summer breeze...".

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  5. Japs,

    Todo mundo sabe que há um fonema oculto entre o "a" e o "s".
    Mas só alguns poucos privilegiados chegam a aplicá-lo com perfeição (e há também outros erros que os não cariocas insistem em cometer). rs

    É como eu sempre digo: "Vai, Hector! ser ixxxxxxquerdo na vida!"

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